5.12.13

Estranhos negócios e feitiçarias na Embaixada de Portugal em Paris

A historia que hoje vos conto até parece ficção. No melhor pano cai a nódoa, por isso saliento que a maioria dos diplomatas portugueses
não tem comportamentos idênticos aos aqui descritos - conheço aliás vários diplomatas “a sério”. Mas, como são duas historietas a um tempo ridículas e cómicas, cabem bem nesta série de “histórias tristes”. E, numa escola francesa de jornalismo, aprende-se esta máxima com a qual concordo: quando um avião tem uma avaria em voo a notícia deve ser sempre divulgada, quando chega ao destino sem problemas não é preciso, quando não se verificam incidentes não é notícia.
. O adido da Embaixada de Portugal ganhava, como os seus colegas, à volta de dez mil euros por mês, mais subsídio para a casa. Mas, como queria ficar rico em pouco tempo – a sua missão, pensava, era curta, de apenas três anos – meteu-se em inacreditáveis negócios paralelos na capital francesa. Comprava carros usados e expunha-os junto ao passeio da porta principal da Embaixada, na zona de estacionamento privativa do corpo diplomático, na rua de Noisiel, em Paris, com o anúncio “à venda” e um número de telemóvel, o dele, no pára-brisas. Quando deu conta dos expedientes, no mínimo invulgares, do adido, o embaixador aborreceu-se com o seu atrevimento: às vezes, o seu motorista nem encontrava lugar para parar o automóvel oficial nos escassos espaços reservados! Proibiu-o então de estacionar os carros para venda na área diplomática. Porque não havia, nem há, estacionamento gratuito naquela zona de Paris
Mas o “diplomata” não se ficou, durante a sua estada em Paris, pela compra e venda de automóveis. Para ganhar dinheiro, revelava uma imaginação quase sem limites. A mulher, notária em Portugal, pediu uma licença sem vencimento e instalou-se em Paris. Esperto, o adido pensou então noutro lucrativo negócio: a esposa passaria a dar conselhos jurídicos (pagos, claro) aos emigrantes que têm, frequentemente, bem intrincados problemas administrativos e jurídicos para resolver nas berças. “Uma mina, com os carros, os conselhos jurídicos e mais o salário vou ficar mesmo rico bem depressa”, terá pensado. Abusando do seu estatuto de diplomata, imaginou uma jogada reveladora do seu génio interesseiro. Tentou, junto do director da rádio Alfa, meter uma cunha para que esta lhe produzisse e difundisse na antena, gratuitamente, anúncios para arranjar clientes para a mulher. Perante a recusa do director, que lhe respondeu dizendo que a publicidade era paga na rádio e o mandou falar com o serviço comercial, amofinou-se e nunca mais falou com ele…
Repito que a maioria dos diplomatas portugueses não é, felizmente, composta por gente bizarra como este adido tão especial. Mas há alguns que protagonizaram situações estranhíssimas, bem grotescas, em Paris.
Esteve por exemplo em funções nesta cidade um embaixador que adorava longas cavaqueiras enquanto bebia uns copos com os amigos. No fim das recepções oficiais, e em muitas outras ocasiões, convidava-os para, em “petit comité”, degustarem bebidas de primeira, nos salões da Embaixada, em serões até altas horas da madrugada. O problema é que, quando recebia os amigos, ele obrigava os empregados de mesa, porteiros e criadas, a fazerem horas extraordinárias, não pagas, pela noite dentro. As bebidas eram servidas aos convivas com todo o cerimonial e com os empregados vestidos a rigor! Um dia, os criados chatearam-se a sério porque consideravam estas noitadas um verdadeiro abuso – dormiam pouco, deitavam-se tarde e tinham de levantar-se cedo. Passaram então a diluir medicamentos para dormir nos copos para que os convivas tivessem sono e as noitadas acabassem mais cedo. Mas, como não gostavam mesmo do diplomata, que consideravam ser um ditador, foram mais longe: faziam contra ele, no maior dos segredos, magia negra, com bonecos de pano e agulhas! Quando descobriu a feitiçaria e a surpreendente forma que assumiu a revolta dos criados, o embaixador explodiu numa das suas mais históricas cóleras. E despediu todos os lacaios envolvidos nas sessões de bruxaria!
Estas duas historietas parecem anedotas ridículas? Evidentemente. Mas espelham o modo como algumas pessoas das nossas elites se comportam.
A primeira aconteceu nos anos 2000, a segunda nos anos 1980. Figas…
 
Daniel ribeiro
Jornalista

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