6.2.15

Angola: o fim do sonho


O fim do sonho angolano

Angola já não é o que era - e pelo caminho Tiago Sousa passou de imprescindível a indesejado. Ao fim de seis anos a trabalhar nos casinos de Angola, o profissional de marketing, de 39 anos, não aguentou mais as dificuldades crescentes na renovação dos vistos, os aumentos salariais a transitarem de generosos para irrisórios, a imposição de regras cada vez mais restritas e avulsas na empresa, as notícias sobre portugueses assassinados e a rarefação do dólar, trocado por um kwanza praticamente inútil entre imigrantes.
"O aumento de mão de obra qualificada barata acabou por se refletir nas condições de trabalho dos portugueses que já estavam em Angola", diz. "Era normal termos aumentos anuais consideráveis, que se foram tornando marginais, nos últimos anos. Também os tempos de espera dos vistos aumentaram, e nos últimos dois anos deixou de ser possível renová-los sem sair do território. Outra alteração que motivou a minha saída foi a 'desdolarização' levada a cabo pelo executivo angolano, sendo que os expatriados passaram a receber em kwanzas." A tudo isto, continua, "junta-se o problema de falta de divisas no mercado angolano, inviabilizando a transferência de valores provenientes de salários ou negócios."
Uma situação já de si hostil poderá tornar-se catastrófica para os imigrantes portugueses. O petróleo, que caiu drasticamente nos últimos meses para os 45 dólares o barril, é a base da economia angolana: representa 43% do PIB, 98% das exportações e 72% das receitas do Estado. O Presidente angolano ordenou, entretanto, que se fizesse um orçamento retificativo a partir de um preço por barril de 40 dólares, em vez dos 81 dólares orçamentados para 2015, o que implica cortes nas despesas de 14 mil milhões de dólares (12,3 milhões de euros). Outra medida em cima da mesa é a introdução de quotas às importações, limitando a entrada de produtos básicos cuja produção nacional cubra 60% das necessidades, como cerveja e produtos hortícolas, o que deixará em maus lençóis muitas das nove mil empresas portuguesas que exportam para Angola.
Por tudo isto, Tiago Sousa assegura que não podia estar mais satisfeito por ter saído, em novembro. "Amigos meus que continuam em Angola estão preocupados com as recentes notícias sobre uma política de austeridade no país, com o aumento do preço da gasolina (quando saí, o preço de um litro estava a 60 kwanzas, e ainda esta semana subirá para 120 kwanzas) e com as repercussões que tudo isso possa ter na população em geral. Prevê-se desemprego e convulsões sociais." Que os portugueses - imigrantes e não só - serão dolorosamente afetados, ninguém duvida. Mas quão profunda será a ferida?

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