29.4.15

Texto - Historias veridicas da Emigração - Auto de interrogatorio a cidadão reguila


Estava eu tão descansado naquela linda manhã, respirando perfumes de maio, quando fui interrompido por estridente e telefónico som inimigo:

“Allô… daqui fala Pinto Barradas. O senhor chanceler vai ter que ouvir em auto de interrogatório, a pedido da Justiça portuguesa, um cidadão que fez das boas…

- Sim, claro, senhor cônsul-geral, vou chama-lo à sala de espera?

- Sim…Não…Espere ai, eu próprio o levo ao seu gabinete”.

E apareceram-me em curto prazo o corpanzil do cônsul empurrando o frágil “arguido”.

- “Tome la, - lançando a carta precatoria - e extraia dele tudo o que for necessário para boa elucidação da autoridade.”. E saiu repentinamente para se dedicar, decerto, a actividades mais importantes.

- “Senhor…?”

- “Jaquim Manoel”, responde com largo sorriso o faltoso.

Li rapidamente e em silêncio o termo de culpa, sem de vez em quando ter de reprimir um esboço de riso. A situação era cómica e eu, transformado em magistrado, tinha de manter um oficial respeito.

Li ao arguido o relatório elaborado pelo cabo-comandante da GNR do Seixal…

O Jaquim Manoel era o protótipo do tuga bem disposto; amável, risonho mas, que quando a coisa saia para o torto, não deixava crédito por mãos alheias…Pequenino, moreno de cabelo preto, bigodaça enorme, ia sorrindo à medida que lhe lia o auto.

E o auto redigido pelo cabo tinha uma certa graça.

- “Eram 4 horas da manhã quando vi um carro de matricula estrangeira aproximar-se do ponto de controlo a alguma velocidade. Instado a parar, o conductor parou. Como lhe fiz a observação de que me parecia estar ébrio, rindo me respondeu: “Pois, tive numa festa e querias que bebesse agua seu labrego”.

Ignorando o insulto, pedi-lhe que soprasse no detector de alcoolemia, ao que me respondeu: “Só sopro depois de tu soprares seu manguela”…

Pedi-lhe, então que me mostrasse os documentos de identificação e da viatura, ao que me respondeu: “Eu mostro-te é o caralho!”.

“Diga-me então o seu nome” ao que respondeu: “Olha, em português é Jaquim Manoel e em francês é tens os cornos virados para tras”…

De paciência esgotada apontei-lhe a arma de serviço; mas o individuo saindo bruscamente do veiculo, apoderou-se da mesma, deu-me dois pares de estalos, rasgou-me a farda e pirou-se. Viria a saber algumas horas depois que já se encontrava no estrangeiro de França.

Logicamente, o assunto não sendo meu, esperei a sua saída para desatar umas gargalhadas largas.

Bem, confesso que perante o pitoresco da situação apenas pedi ao Jaquim Manel que assinasse o depoimento…

29-04-2015

JoanMira